Cartas de Foral - Tavira
Nota:
Deliberadamente continuo s escrever segundo as normas do ACORDO ORTOGRÁFICO de 1945
Uma Carta de Foral ou, simplesmente, Foral é “o diploma outorgado pelo Rei, ou por um senhorio laico ou eclesiástico, a determinada terra, contendo normas que disciplinam as relações dos seus povoadores ou habitantes entre si, e destes, com a entidade outorgante”, ou seja, são cartas de privilégio que conferem a um território ou comunidade um regime jurídico próprio.
O foral é um documento clarificador e definidor das obrigações e dos direitos fundamentais, ou seja, dos privilégios dos munícipes.
Visava estabelecer um concelho e regular a sua administração, deveres e privilégios.
A Tavira foram outorgados 3 forais
Os dois primeiros no Séc. XIII por D. Afonso III
e o último por D. Manuel I no Séc. XVI
Forais Afonsinos
Foral Velho - 1266 (12 de Julho) Afonso III
Foral dos Mouros Forros - 1269 (12 de Julho)
Foral Manuelino
Foral Novo - 1504 (20 de Agosto)
Os forais foram concebidos entre o século XII e o século XVI tendo sido extintos por Mouzinho da Silveira pelo decreto conhecido por "lei dos forais" foi publicada em 13 de Agosto de 1832
Tavira e D. Afonso III
As preocupações de D. Afonso III com Tavira, nos meados do séc. XIII, não se relacionavam apenas com questões de povoamento mas sobretudo com o exercício do poder e posse da terra, neste caso alargado a todo o Algarve.
FORAL AFONSINO - FORAL VELHO - 1266
Em nome de Cristo e Sua Graça, notificamos, tanto os presentes como os futuros, que eu Afonso, pela Graça de Deus, Rei de Portugal (1) com minha mulher a Rainha D. Beatriz, filha do ilustre Rei de Castela e Leão (2), e nossos filhos e filhas, os infantes D. Dinis, e D. Afonso e Dona Branca e Dona Sancha, faço carta de foro a vós povoadores de Tavira presentes e futuros, foro, usos e costumes como os da Cidade de Lisboa, excepto a jugada de pão de que vos desobrigo (3) perpetuamente e retenho para mim e todos os meus sucessores, todos os fornos de pão e todas as salinas, construídas ou a construir (4) em Tavira e seu termo, e todas as tendas (5) que os reis sarracenos tinham no seu tempo(6).
Igualmente reservo para mim e todos os meus sucessores que se não venda pão em Tavira nem no seu termo (7) outro sal, senão o meu. Também reservo para mim e todos os meus sucessores que o vizinho de Tavira que quiser levar o vinho de Tavira ou de seu termo me (8) pague, de cada tonel de vinho que tenha comprado, meio morabitino. E quem não for vizinho pague, por cada tonel de vinho que levar, um morabitino, e em face disso vos desobrigo e àqueles (9) que levarem vinho de Tavira ou de seu termo, daqueles almudes de vinho que pagam em Lisboa, de portagem do vinho que tiram por mar, salvo o direito de relego, durante os seus três meses (10).
Também reservo para mim e para meus sucessores, as casas que foram de Abenffabílya e a adega (11) da Alfeição (12), e a horta que foi de Abenfabílya (13) e a outra horta que o bispo (14) tinha e todos os figueirais e vinhas que receberam para os meus reguengos conforme foram demarcados (15) e as azenhas da ponte, e todos os moinhos da Aceca construídos e a construir, e pisões e azenhas, se aí as fizerem, excepto os moinhos que Domingos Rodrigues (16) tinha, os quais dei a Dom João de Aboim, por seu herdamento, pela minha carta com selo de chumbo (17).
Também retenho para mim e para todos os meus sucessores, os açougues, fangas e banhos (18) de Tavira, e a pesca da baleia (19) e todo o direito de padroado das igrejas, construídas e a construir em Tavira e seu termo. E em todas as outras coisas além das referidas, dou e concedo-vos o foro, usos e costumes da cidade de Lisboa cujo foro é assim: (20).
Dou-vos ainda por foro, etc, (21) o que acima foi dito na carta registada do foro de Silves.
NOTAS
1 -- ou juntamente com minha mulher.
2 -- Damião de Vasconcelos traduz esta passagem erradamente por "ilustre filha dos reis de Castella e Leão". D. Beatriz era até filha bastarda de Afonso X.
3 -- Preferimos desobrigo a quito, por ser termo arcaico.
4 -- O texto original faz a separação de masculinos e femininos repetindo as formas verbais. Eliminámos essa redundância.
5 -- Outros traduziram por casas.
6 -- Eliminada a redundância "no tempo dos sarracenos".
7 -- No texto vem no plural "in suis terminis".
8 -- "Solvat michi. Michi é uma variante de mihi, dativo do pronome pessoal, primeira pessoa.
9 -- àqueles, tradução do dativo illis.
10 -- Reduzimos a frase sem atraiçoar o seu sentido.
11 -- Encontrámos e mantivemos apotecam traduzida por adega, mas é um termo que pode ter mais significação.
12 -- Alfeição ou Afeição que aparece em velhas tradições em Tavira.
13 -- O nome apresenta-se com variantes e até minúscula na inicial: abenfalilya.
14 -- Refere-se a D. Roberto, bispo de Silves, proposto por Afonso X. A horta fica na propriedade dos Carvalhos na Rua do Poço do Bispo.
15 -- Eliminámos as distinções causadas pelos diferentes géneros. Partimos do princípio de que o escriba usou o e em vez do ditongo ae na palavra demarcate. Demarcados refere-se a figueirais e vinhas.
16 -- Valido de D. Afonso X.
17 -- A carta consta do Apêndice deste trabalho. Ela completa o nosso foral precisando que os bens doados em 4 de Abril de 1265 por D. Afonso III a D. João de Aboim, seu mordomo e "crientulo" (homem da sua criação), são os seguintes: casas, vinhas, figueirais, hortas, moinhos e herdades de lavoura. O Foral de Tavira apenas refere moinhos.
18 -- Banhos e não baleias. Havia também banhos públicos em Loulé e Faro e também o Rei os reservou para si.
19 -- Existia realmente a pesca da baleia no Algarve.
20 -- Deveria naturalmente seguir-se a transcrição do Foral de Lisboa, o que não acontece.
21 -- Este etc. substitui as palavras "usus et consuetudines" que o escrivão não quis repetir.
OBS:
O foral de Tavira com o de Silves, Faro e Loulé, são os mais antigos do Algarve e foram concedidos por D. Afonso III, em Lisboa, no mês de Agosto (a) de 1266.
Está registado no Livro lº de Dom Afonso III, fl 97 v. e arquivado na Torre do Tombo
In II Jornadas de História / Clube de Tavira (1993)
Armando da Costa Franco
António Araújo de Sousa
Octávio Ribeiro
(a) Outros Autores/Historiadores apontam para o mês de Julho
Em 1269, o mesmo D. Afonso III concede o Foral dos Mouros Forros de Silves, Tavira, Loulé e Santa Maria de Faro,
Foral dos Mouros Forros de Silves, Tavira, Loulé e Santa Maria de Faro – 1269
“Em nome de Deus e por sua graça. Saibam todos os que esta carta virem que eu, Afonso, pela graça de deus Rei de Portugal e do Algarve, com minha mulher a Rainha D. Beatriz, filha do ilustre Rei de Leão e Castela e com os nossos filhos e filhas os Infantes D. Dinis, D. Afonso, D. Fernando, D. Branca e D. Sancha, faço carta de foro e segurança a vós, Mouros que sois forros em Silves, Tavira Loulé e Santa Maria de Faro.
Mando que nenhum [meu] cristão ou judeu tenha poder de fazer-vos mal ou vos forcem, mas só quem for o vosso alcaide vos julgue. E isto faço para que vós me deis em cada ano cinco morabitinos pagos por cinco notáveis vossos no tempo em que apanhardes os vossos frutos. E me dareis alfitra e azaqui1, e a dízima de todo o vosso trabalho. E trabalhareis para sempre as minhas vinhas e lagares e fareis estritamente o meu vinho tal como o fazem os meus mouros forros de Lisboa; e em todas as outras coisas deveis fazer e usar como usam e fazem os meus mouros forros de Lisboa. Assim, esta carta tenha sempre segurança e ninguém a ouse violar nem os vossos foros. E eu sobredito rei Afonso, com a minha mulher e meus filhos e filhas supraditos, que mandei fazer esta carta, assino-a e confirmo-a; e para maior clareza disto fiz a presente carta ser autenticada com o meu selo de chumbo. Feita em Lisboa, aos doze dias de junho. Era de mil trezentos e sete [1269 da era de Cristo].
Foram presentes João Soeiro Coelho, Rodrigo Garcia de Paiva, Fernando Fernandes Cogominho, Pedro Martins Petarinho, Afonso Soeiro sobrejuiz, Martinho Peres, Domingos Vicente, Domingos Peres, João Fernandes, Estêvão de Rates, Vicente Eanes clérigo do senho Rei, testemunhas;
D. Gonçalo Garcia alferes terratenente de Neiva, D. João de Aboim, Mordomo da Cúria; D. Afonso Lopes, terratenente de Riba de Minho; D. Diogo Lopes, terratenente de Lamego; D. Pedro Eanes terratenente da Beira; D. Mendo Rodrigues, terratenente da Maia; D. P. Ponces, terratenente de Vouga; D. Estêvão Eanes, terratenente de Chaves; D. Pedro Eanes de Portel, terratenente em Sintra e Leiria, confirmam.
D. Martinho Arcebispo de Braga; D. Vivente, Bispo do Porto; D. Pedro, Bispo de Lamego, está vaga a sé de Viseu; vaga a de Coimbra e a da Guarda; D. Mateus, Bispo de Lisboa, D. Durando, Bispo de Évora, D. Bartolomeu, Bispo de Silves, confirmam;
D. Estêvão Eanes, Chanceler da Cúria, confirmo. Vicente Fernandes escrivão da Cúria a fez”.
Foral dos Mouros Forros (livres) de Silves, Tavira, Loulé e Faro - 1269
Painel de azulejos - Mouros Forros de Faro - Foto de Ricardo Martins
Decorridos vinte e três anos após a tomada de Lisboa e da área adjacente, precisamente em Março de 1170 em Coimbra, D. Afonso Henrique concedeu um foral aos muçulmanos livres, correntemente designados por Mouros forros de Lisboa e extensivo aos de Almada, Palmela e Alcácer do Sal e que curiosamente precedeu de nove anos a concessão de foral à própria cidade de Lisboa.
Precisemos que os Muçulmanos foram a única minoria contemplada pela legislação régia da altura.
Este foral continha disposições legais que definiram o estatuto da comunidade de Muçulmanos no seio da sociedade cristã, garantindo-lhes a liberdade de religião e a conservação das suas propriedades mediante pagamento dos impostos e cumprimento de certas obrigações, em suma, um quadro específico dos seus deveres e direitos.
Confirmado em 1217 em Santarém, já no reinado de D. Afonso II e com o aditamento da inviolabilidade do seu domicílio, este foral constituiu o modelo de toda a legislação posterior que abrangeu esta minoria como, por exemplo, nos de Tavira, Loulé, Silves e Faro datados de 1269, concedidos depois de concluída a reconquista.
Tratado de Badajoz
O Tratado de Badajoz foi assinado em 16 de Fevereiro de 1267 por Afonso III de Portugal e Afonso X de Leão e teve como objectivo o tratado, estabelecer a quem pertencia o Algarve, a Portugal ou ao rei de Castela e de leão, como o rei de Castela e de Leão alegava direitos devido à posse de feudos no Algarve, mas com a assinatura do tratado foi estabelecido bases de cooperação e de amizade entre ambos os reinos.
Este documento constitui a carta da fundação de uma das fronteiras mais antigas da Europa com consequências directas na configuração moderna que hoje conhecemos como Espanha e Portugal.
NOTA 1;
Os forais foram concebidos entre o século XII e o século XVI tendo sido extintos por Mouzinho da Silveira em 1832.
Os forais foram concebidos entre o século XII e o século XVI tendo sido extintos por Mouzinho da Silveira em 1832.
NOTA 2 (Tavira na Literatura Nacional)
Para saber mais e melhor ver
https://repositorioaberto.uab.pt/bitstream/10400.2/4434/1/TMECLOA_HelenaBlanc.pdf
Com estas ações, pretendemos manter viva a chama dos grandes feitos da nossa
história e de um povo decidido, ilustrado pela valentia de heróis da História de Portugal,
mas também imortais como o grande Mestre de Santiago, Dom Paio Peres Correia, que
Camões (n. entre 1517 e 1525-15809) exaltou no poema épico mais representativo deste
imaginário:
Olha um mestre que desce de Castela,
Português de nação, como conquista
A terra dos Algarves, e já n’ella
Não acha quem por armas lhe resista:
Com manha, esforço e com benigna estrella,
Villas, castellos toma, à escala vista:
Vês Tavilla tomada aos moradores,
Em vingança dos sete caçadores?
[Camões, Luís Vaz. Os Lusíadas, Estância XXV, Canto VIII]
e
O episódio da tomada de Tavira aos mouros também ocupa um lugar de relevo
no poema Dona Branca ou A Conquista do Algarve, 1826, com o qual Almeida Garrett
(1799-1854) inaugurou o Romantismo em Portugal, transpondo para a arte da sua lírica
a narrativa do rapto de uma moura por Mem do Vale, cavaleiro cristão da Ordem de
Santiago:
Mem do Vale picou, e per um trilho
Agreste e rudo entre árvores e mato
[…]
Jaz sobre a relva à deleitosa sombra
Do espesso arvoredo adormecida
Jovem Beldade […]
E eu cristão cavaleiro, que hei jurado
De defender a fé e a formusura, […]
Salvá-la é força e já […] Toma-a nos braços
Salta na sela, - e parte, corre, voa.
Vozes mil a gritar: Ei-los vão, ei-los!
O roubador infiel! Ei-la a princesa
Acudi, acudi, vingai no infame
Milhares caem. De Tavira às portas
Acossados os leva; e as portas, que abre
Para acolher os seus o muçulmano,
Ao mestre foram triunfal entrada
Na capital do subjugado Reino.
Almeida Garrett, João Baptista da Silva Leitão de.
Dona Branca ou A conquista do Algarve, 1826.
FORAL MANUELINO TAVIRA
Foral Manuelino de Tavira (Armas representadas no Foral)